A irmã esteve quase sempre calada como que adivinhando o turbilhão de pensamentos dele, serviu-lhe uma sopa quente, pão cozido em casa e um queijo que ela mesma fazia acompanhado por um vinho tinto bebido em malga.
- Se não sais de casa, como é que consegues ter estas coisas aqui? Perguntou o Jorge.
- O velho António jardineiro traz-me tudo o que preciso, como sabes sempre nos entendemos bem. Jorge compreendeu então porque pensavam as pessoas que ela não tinha nada em casa. O velho António era mudo e não passava confiança a ninguém. Vivia numa pequena arrecadação no fundo do quintal da casa. O velho era o homem de confiança do seu pai e dedicava-lhe uma devoção e fidelidade quase canina, fidelidade essa que se estendi a todos os elementos da família.
- Pensava que o velho tinha morrido, sempre o conheci velho desde que me lembro, que idade terá? Ele ria-se sempre que eu lhe perguntava isso e nunca me respondeu. Porque não cuidas do jardim?
- Ainda não foste á parte de trás da casa, o quintal sempre foi cultivado. O Jardim deixei-o ficar assim para afugentar curiosos que tentavam espreitar cá para dentro, e como vês a casa por dentro também está limpa a e arrumada. Bem, vou-te preparar o quarto.
Jorge deitou-se na cama feita de lavado, deleitando-se com a suavidade dos lençóis, os cheiros da infância e juventude que o invadiam. Fechou os olhos embalado por essas recordações, olhou a janela, a figueira cujos ramos lhe serviam de escada para fugidas sub-reptícias, iluminada pelo luar e lhe projectava sombras chinesas na parede do quarto, quase sentia o cheiro da salva, do rosmaninho…e do tabaco do pai, esse ali, presente de novo! Tentou conciliar o sono, afugentar as memórias que o assaltavam agora.
Chegara a casa depois da hora de jantar, franqueara o portão e como sempre fazia foi soltar o piloto para fazer as rondas nocturnas á casa. O cão estava agitado, correu para a janela do escritório do pai, Jorge foi-lhe no encalço, o cão especou-se na janela a ladrar furiosamente, mas era alta e Jorge não conseguia espreitar, entrou em casa a correr…ao entrar sentiu uma pancada na cabeça que o derrubou por terra e ficou ali numa semi-inconsciência que não o deixava mexer mas conseguia ouvir… Entreabriu os olhos, viu ao nível do chão uma bota que os trabalhadores da construção civil usam, sentia a pressão forte da outra sobre o seu pescoço impelindo-o contra o chão impedindo-o de se mover. Pela porta do escritório entreaberta, ouvia a voz do pai.
- Não, por favor não, eu limitei-me a fazer o que a minha consciência mandava. Vocês não têm o direito de molestar a minha família. Vocês também são vítimas disso, pensem nas vossas famílias, foi também os vossos direitos que defendi. Subitamente vê o corpo do pai na frincha da porta, projectado violentamente contra a estante dos livros, uma mão segura-o pelos colarinhos, aparece uma segunda mão à altura do abdómen do pai, esta porém com uma navalha longa e fina de dois gumes
- Não! Gritou Jorge mas a pressão da bota nesse instante matou o grito e ficou de olhos arregalados a ver a faca a entrar lentamente, rompendo o colete do fato, atravessando o tecido da camisa, de repente vê-se o sangue espirrar inundando a mão que segurava a navalha. Tomado de instinto felino o agressor retira a navalha de repente e espeta-a de novo desta feita com uma violência inusitada demonstrativa de força e poder. Vê o sangue afluir á boca do pai em golfadas que lhe escorrem do queixo abaixo. A outra mão continuava a segurá-lo pelos colarinhos não o deixando cair, como se o agressor fizesse questão de ver a vida desaparecer dos olhos dele, como se lhe quisesse sentir o cheiro adocicado da morte directamente do hálito… Largou-o e ficou a ver o pai escorregar lentamente pela estante até se imobilizar no chão já sem vida.
Sentiu um pontapé violento na cara, outro nos rins quando se dobrou de dor.
- Também gostava de tratar deste filho da puta. Ouviu numa voz rouca, abafada pelo álcool e por capuz passa-montanhas.
- Não! O patrão disse para não fazermos mal a mais ninguém, vamos mas é embora.
Sentiu outro pontapé violento no rosto que lhe partiu o maxilar. Os dois homens afastaram-se, até á porta de entrada. Tentou olhá-los, estes ainda se viraram para trás.
- Não perdes pela demora meu cabrão. Dissera o algoz que o segurara, olhos castanhos e uma melena que lhe saia da máscara, preta e profusa, fungou em jeito de tique e desapareceram os dois no silêncio da noite…
- Se não sais de casa, como é que consegues ter estas coisas aqui? Perguntou o Jorge.
- O velho António jardineiro traz-me tudo o que preciso, como sabes sempre nos entendemos bem. Jorge compreendeu então porque pensavam as pessoas que ela não tinha nada em casa. O velho António era mudo e não passava confiança a ninguém. Vivia numa pequena arrecadação no fundo do quintal da casa. O velho era o homem de confiança do seu pai e dedicava-lhe uma devoção e fidelidade quase canina, fidelidade essa que se estendi a todos os elementos da família.
- Pensava que o velho tinha morrido, sempre o conheci velho desde que me lembro, que idade terá? Ele ria-se sempre que eu lhe perguntava isso e nunca me respondeu. Porque não cuidas do jardim?
- Ainda não foste á parte de trás da casa, o quintal sempre foi cultivado. O Jardim deixei-o ficar assim para afugentar curiosos que tentavam espreitar cá para dentro, e como vês a casa por dentro também está limpa a e arrumada. Bem, vou-te preparar o quarto.
Jorge deitou-se na cama feita de lavado, deleitando-se com a suavidade dos lençóis, os cheiros da infância e juventude que o invadiam. Fechou os olhos embalado por essas recordações, olhou a janela, a figueira cujos ramos lhe serviam de escada para fugidas sub-reptícias, iluminada pelo luar e lhe projectava sombras chinesas na parede do quarto, quase sentia o cheiro da salva, do rosmaninho…e do tabaco do pai, esse ali, presente de novo! Tentou conciliar o sono, afugentar as memórias que o assaltavam agora.
Chegara a casa depois da hora de jantar, franqueara o portão e como sempre fazia foi soltar o piloto para fazer as rondas nocturnas á casa. O cão estava agitado, correu para a janela do escritório do pai, Jorge foi-lhe no encalço, o cão especou-se na janela a ladrar furiosamente, mas era alta e Jorge não conseguia espreitar, entrou em casa a correr…ao entrar sentiu uma pancada na cabeça que o derrubou por terra e ficou ali numa semi-inconsciência que não o deixava mexer mas conseguia ouvir… Entreabriu os olhos, viu ao nível do chão uma bota que os trabalhadores da construção civil usam, sentia a pressão forte da outra sobre o seu pescoço impelindo-o contra o chão impedindo-o de se mover. Pela porta do escritório entreaberta, ouvia a voz do pai.
- Não, por favor não, eu limitei-me a fazer o que a minha consciência mandava. Vocês não têm o direito de molestar a minha família. Vocês também são vítimas disso, pensem nas vossas famílias, foi também os vossos direitos que defendi. Subitamente vê o corpo do pai na frincha da porta, projectado violentamente contra a estante dos livros, uma mão segura-o pelos colarinhos, aparece uma segunda mão à altura do abdómen do pai, esta porém com uma navalha longa e fina de dois gumes
- Não! Gritou Jorge mas a pressão da bota nesse instante matou o grito e ficou de olhos arregalados a ver a faca a entrar lentamente, rompendo o colete do fato, atravessando o tecido da camisa, de repente vê-se o sangue espirrar inundando a mão que segurava a navalha. Tomado de instinto felino o agressor retira a navalha de repente e espeta-a de novo desta feita com uma violência inusitada demonstrativa de força e poder. Vê o sangue afluir á boca do pai em golfadas que lhe escorrem do queixo abaixo. A outra mão continuava a segurá-lo pelos colarinhos não o deixando cair, como se o agressor fizesse questão de ver a vida desaparecer dos olhos dele, como se lhe quisesse sentir o cheiro adocicado da morte directamente do hálito… Largou-o e ficou a ver o pai escorregar lentamente pela estante até se imobilizar no chão já sem vida.
Sentiu um pontapé violento na cara, outro nos rins quando se dobrou de dor.
- Também gostava de tratar deste filho da puta. Ouviu numa voz rouca, abafada pelo álcool e por capuz passa-montanhas.
- Não! O patrão disse para não fazermos mal a mais ninguém, vamos mas é embora.
Sentiu outro pontapé violento no rosto que lhe partiu o maxilar. Os dois homens afastaram-se, até á porta de entrada. Tentou olhá-los, estes ainda se viraram para trás.
- Não perdes pela demora meu cabrão. Dissera o algoz que o segurara, olhos castanhos e uma melena que lhe saia da máscara, preta e profusa, fungou em jeito de tique e desapareceram os dois no silêncio da noite…
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