Jorge deixou as malas no chão conforme as tinha tirado do táxi, olhou o portão de ferro carcomido pela ferrugem, as silvas abastavam em volta dele, Jorge procurou rodar o puxador, nada… Olhou em volta, viu uma pequena verga de ferro, pegou-a e introduziu-a na argola do puxador, fez força…mais força…toda a sua força… O trinco deu um baque surdo e abriu-se. Empurrou o portão com força, contra as silvas, montes de terra acumuladas pelo vento, ervas daninhas alimentadas pelas intempéries, aquele empurrar, a força que empregou deu-lhe uma imagem do que o esperava. Finalmente conseguiu, o portão entreabriu-se o suficiente para conseguir entrar. Olhou o outrora lindo jardim cheio de ervas daninhas quase do seu tamanho mas descortinava-se um trilho entre o mato espesso, sinal de local de passagem, tomou esse caminho em direcção à entrada do alpendre que dava a volta a toda a casa. De repente ouviu um restolhar de ervas, ramos e folhas a serem calcados rapidamente o barulho aproximava-se a uma velocidade enorme, de repente estaca mesmo aos seus pés num rosnar surdo… depois cala-se… Dá um ganido, e salta-lhe para as pernas num reconhecimento que denunciava toda a saudade acumulada. O velho cão, o Piloto, estava com o pêlo sedoso e penteado, via-se que estava a ser bem tratado ao contrário da casa. Deixou que o cão o lambesse no rosto e nas mãos, voraz na vontade de receber mimos. Ouviu-se uma voz:
- Piloto? Quem está aí? Quem se atreveu a entrar? Como é que deixaste? Raios partam o cão que está velho… Numa imprecação ouviu o caminhar da irmã pela folhagem, num passo arrastado.
- Sou eu minha irmã, o Jorge… Os passos pararam… parou ao mesmo tempo o chilrear dos pássaros que recolhiam ao ninho, o vento agreste que soprava de norte deixou de derrubar as folhas que profusas se acumulavam no chão, os ramos outrora agitados imobilizaram-se numa estranha quietude, o Piloto parou de o lamber e de ganir de saudades imobilizando-se de cauda espetada. Jorge nem queria acreditar no súbito silêncio preso pelas palavras dele, o cheiro no ar que não conseguia reconhecer mas que lhe era estranhamente familiar, sentia o coração acelerar para decibéis que pressentiu perigosos pela pressão que exercia no seu peito.
E como que vindo do nada a irmã apareceu-lhe em frente abraçando-o, dando-lhe o carinho de irmã mais velha que lhe faltou tantos anos, que só as missivas que ia recebendo nos vários destinos que percorreu mitigavam mas via agora nunca ter chegado….estava em casa… agora sim. E os pássaros como que tendo recebido ordem para tal, retomaram o seu canto mais estridentes que nunca, o vento agreste abanou as folhagens que voltearam em seu redor, o piloto recomeçou a ladrar alegremente em sua volta e deixou de sentir o cheiro familiar.
- Jorge… Voltaste, finalmente…
- Joana, ouvi coisas estranhas a teu respeito, que nunca sais, nunca mais saíste desde que me fui, meu Deus…olha para ti…esse cabelo…eras tão linda e deixaste-te ficar assim, que se passa contigo?
- Jorge, os nossos pais continuam a habitar este espaço, não os podia abandonar…
- És doida minha irmã, isso são crendices… ‘tás doida?
- Jorge, ouve-me… O pai continua aqui, não sai daqui enquanto não for feita justiça, eu sinto-o…como sinto a mãe, mas a mãe não vai embora por amor ao pai, só irá quando ele for, sabes como eram chegados os dois, amam-se na morte também. Sinto-lhes a presença. Eles irão e o facto de teres voltado dá-me essa certeza, serás tu a fazer justiça, a justiça que falta ao pai para repousar em paz.
- ‘Tás doida Joana, tu tens noção do que estás aí a dizer, não admira que na aldeia digam que perdeste o juízo. O pai morreu, nada o trará à vida de novo, nada Joana.
Joana virou-lhe costas, encaminhou-se para a entrada principal
- Tu perceberás… vou-te fazer algo para comeres e preparar-te um banho que deves estar cansado.
Jorge ficou a vê-la caminhar, o seu ar continuava altivo, o cabelo ultrapassava-lhe a cintura, em cachos loiros matizados de branco puro como as neves da serra. De repente sentiu de novo o cheiro, um arrepio percorreu-lhe a espinha quase que o imobilizando num misto de admiração e medo… Reconheceu o cheiro, era de tabaco fresco de cachimbo que o pai fumava, não via o fumo mas sentia-lhe o cheiro a chegar a ele em baforadas de tabaco gama, a marca que o pai gostava.
- Piloto? Quem está aí? Quem se atreveu a entrar? Como é que deixaste? Raios partam o cão que está velho… Numa imprecação ouviu o caminhar da irmã pela folhagem, num passo arrastado.
- Sou eu minha irmã, o Jorge… Os passos pararam… parou ao mesmo tempo o chilrear dos pássaros que recolhiam ao ninho, o vento agreste que soprava de norte deixou de derrubar as folhas que profusas se acumulavam no chão, os ramos outrora agitados imobilizaram-se numa estranha quietude, o Piloto parou de o lamber e de ganir de saudades imobilizando-se de cauda espetada. Jorge nem queria acreditar no súbito silêncio preso pelas palavras dele, o cheiro no ar que não conseguia reconhecer mas que lhe era estranhamente familiar, sentia o coração acelerar para decibéis que pressentiu perigosos pela pressão que exercia no seu peito.
E como que vindo do nada a irmã apareceu-lhe em frente abraçando-o, dando-lhe o carinho de irmã mais velha que lhe faltou tantos anos, que só as missivas que ia recebendo nos vários destinos que percorreu mitigavam mas via agora nunca ter chegado….estava em casa… agora sim. E os pássaros como que tendo recebido ordem para tal, retomaram o seu canto mais estridentes que nunca, o vento agreste abanou as folhagens que voltearam em seu redor, o piloto recomeçou a ladrar alegremente em sua volta e deixou de sentir o cheiro familiar.
- Jorge… Voltaste, finalmente…
- Joana, ouvi coisas estranhas a teu respeito, que nunca sais, nunca mais saíste desde que me fui, meu Deus…olha para ti…esse cabelo…eras tão linda e deixaste-te ficar assim, que se passa contigo?
- Jorge, os nossos pais continuam a habitar este espaço, não os podia abandonar…
- És doida minha irmã, isso são crendices… ‘tás doida?
- Jorge, ouve-me… O pai continua aqui, não sai daqui enquanto não for feita justiça, eu sinto-o…como sinto a mãe, mas a mãe não vai embora por amor ao pai, só irá quando ele for, sabes como eram chegados os dois, amam-se na morte também. Sinto-lhes a presença. Eles irão e o facto de teres voltado dá-me essa certeza, serás tu a fazer justiça, a justiça que falta ao pai para repousar em paz.
- ‘Tás doida Joana, tu tens noção do que estás aí a dizer, não admira que na aldeia digam que perdeste o juízo. O pai morreu, nada o trará à vida de novo, nada Joana.
Joana virou-lhe costas, encaminhou-se para a entrada principal
- Tu perceberás… vou-te fazer algo para comeres e preparar-te um banho que deves estar cansado.
Jorge ficou a vê-la caminhar, o seu ar continuava altivo, o cabelo ultrapassava-lhe a cintura, em cachos loiros matizados de branco puro como as neves da serra. De repente sentiu de novo o cheiro, um arrepio percorreu-lhe a espinha quase que o imobilizando num misto de admiração e medo… Reconheceu o cheiro, era de tabaco fresco de cachimbo que o pai fumava, não via o fumo mas sentia-lhe o cheiro a chegar a ele em baforadas de tabaco gama, a marca que o pai gostava.
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