terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Duas irmãs à conversa


Numa madrugada igual a qualquer outra não interessa se de frio, se de calor, na azáfama de que ninguém se dá conta àquelas horas a palavra escrita foi projectada num embrulho de um furgão de distribuição pelas livrarias e quiosques. A palavra era a Verdade, escrita por alguém que ainda se importava com a sua importância, caiu a pobre Verdade no meio de outros embrulhos de outras publicações, como quem choca na virtualidade com um qualquer blog ou site de referência. Olhou para o lado e viu outras palavras como ela, muitas, escritas com igual desvelo como ela, outras nem por isso, outras ainda que eram a própria vergonha da Palavra, mãe da Verdade e das outras palavras todas é certo, mas quem não tem filhos dos quais não se orgulhe?
A Verdade reparou na Hipocrisia mesmo ao seu lado escrita numa revista do social, travestida de piedade:
- Que fazes aí Hipocrisia, minha irmã?
- Olha, ganho a vida como tu, tenho tanto direito em aqui estar como tu ó Verdade -respondeu cínica a Hipocrisia.
- Não achas que te expões demais, que cais no ridículo com essas tuas lágrimas de crocodilo só para pareceres que és muito sensível, que és muito amiga? - Retorquiu-lhe a Verdade tentando aconselhar a hipocrisia a mudar de atitude.
- Olha lá ó Verdadinha e se te fosses meter na tua vida ou ainda te solto aqui as minhas amigas que caem já em cima de ti, já sabes como elas te mordem comigo, não sabes? Vens agora armar, bem viste o que fiz à Liberdade, à Caridade, à Solidariedade, ao Amor, ao Carinho, à Ternura, ou já te esqueceste? Porta-te mas é bem se queres continuar a ser publicada, como vês nesses jornalecos á tua volta já ninguém fala dos teus amigos, portanto comporta-te ou chamo a Ira, a Inveja, a Usura, a Falsidade, a Vaidade, a Usurpação e todas essas minhas amigas e derrotamos-te sua convencida e olha que somos muitas, podes chamar quem quiser, e agora deixa-me…
A Verdade calou-se assim amordaçada, recolheu-se á sua insignificância, numa manhã que bem podia ser de frio intenso ouvindo a Hipocrisia com todas as colegas a carpir mágoas pelo desterro e pelas vitimas do Haiti.

Sem comentários:

Enviar um comentário